Imagem aérea de um manguezal.

Preservando as raízes do mangue

O projeto da professora Ívina Langsdorff Santana colocou os alunos para aprender química em campo, na prática.

Por Ívina Langsdorff Santana em set 09, 2020

Com o intuito de estimular a participação dos estudantes do ensino médio, já desmotivados com o estilo padronizado de aulas teóricas, a professora colocou como desafio que eles encontrassem um problema na comunidade na qual a escola está inserida e encontrassem uma solução usando conhecimentos químicos de sua disciplina. A questão encontrada e escolhida foi a produção de panelas de barro da Associação das Paneleiras de Goiabeiras (AGP), uma vez que para fabricarem seus produtos, as paneleiras extraem argila e madeira do mangue, sendo que da madeira é retirado o tanino para tingimento das panelas. Essa extração degrada o meio ambiente da região, uma vez que exige a retirada da casca da árvore do mangue vermelho, danificando a árvore.

Com a proposta, então, de reduzir esses danos, foram colocados em prática os princípios da química verde, no qual, “para que o processo seja ambientalmente favorável e sustentável, deve-se reduzir a quantidade de átomos do processo e estimular a catálise, ou seja, buscar minimizar o tempo e aumentar a eficiência do processo”. Os alunos estudaram os processos que interferem na extração e que alteram a velocidade de reação, fizeram testes em laboratórios, experimentaram uma produção de tinta de maneira diferente e levaram o resultado para que fosse aprovado pelas paneleiras. Ajustando as variáveis, como temperatura e área superficial de contato, conseguiu-se melhorar a velocidade e diminuir o uso de matéria-prima, o que reduz os danos e aumenta a produtividade das paneleiras. O projeto é um ótimo exemplo de como os alunos podem participar mais e interferir em sua comunidade, contextualizando os conhecimentos da sala de aula.

Os processos químicos abordados foram: diferenciação de soluções, coloides e suspensões; classificação da tinta de tanino como um coloide; concentração de cascas por litro de água usada na extração da tinta; montagem de uma escala de cores relacionando a intensidade da cor e a concentração; estudo de fatores que interferem na velocidade de extração de tinta de tanino; desenvolvimento de um método mais rápido e sustentável para a extração da tinta de tanino e aplicação da solução de tanino aprimorada na fabricação de panelas de barro.

Depoimento da professora Ívina Langsdorff Santana sobre a participação no Prêmio Shell de Educação Científica

Após receber o prêmio, me senti mais segura de ter escolhido a profissão certa e mais motivada a continuar trabalhando e inovando em sala de aula. O prêmio também me trouxe reconhecimento perante a escola e a sociedade, bem como ajudou a divulgar minha prática pedagógica entre professores.

A formação oferecida durante a viagem expandiu meus horizontes profissionais e pessoais. Conheci aulas práticas que hoje aplico em sala de aula, conheci mais sobre o método STEM, pude perceber a importância de uma educação científica de qualidade, bem com conhecer novas ideias e formas de organização do ensino que podem melhorar o problema do ensino médio brasileiro.

Costumo dizer que o prêmio foi um divisor de águas na minha carreira e, claro, a mudança foi para melhor e seus frutos não ficaram estagnados. Compartilhei a experiência e o material que trouxe de Londres com os demais professores da escola, que, assim como eu, querem inovar suas aulas.

Nós trabalhamos com a Associação das Paneleiras em Vitória. Para produzir a panela de barro capixaba, elas produzem uma tinta a partir da árvore Rhizophora mangle. Essa extração leva à morte do vegetal ao longo do tempo, causando degradação ambiental.

Em 2017, com o projeto, conseguimos desenvolver uma nova extração que utiliza menos casca de árvore e protege o mangue. Este ano, uma outra turma da escola, inspirada em nosso projeto, deu continuidade à ação junto às paneleiras, desenvolvendo um outro método de extração de madeira que protege a árvore por mais tempo. Esse trabalho foi uma parceria entre as áreas de química e biologia da Escola Almirante e a Associação das Paneleiras de Goiabeiras.

Mini-bio do Autor

Professora Ívina Langsdorff Santana, foi 1º colocada do Prêmio Shell de Educação Científica, 2017, na categoria Ensino Médio – Espírito Santo. O trabalho foi desenvolvido na Escola Estadual Almirante Barroso, município de Vitória (ES).

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